O uso dos computadores e da internet revolucionou a
maneira como as pessoas compram, trabalham e se comunicam. Depois de muitas
tentativas e muitos erros, os educadores começam a perceber o que funciona na
sala de aula.
São Paulo - Na Orestad Gymnasium, uma escola municipal
de Copenhague, na Dinamarca, inaugurada em 2005, até a planta do prédio foi
pensada para viabilizar o conceito de “escola do futuro”. O edifício de cinco
andares tem algumas salas de aula tradicionais, no estilo quatro paredes, uma
porta e janelas. Mas 50% das atividades são realizadas em espaços de
convivência, onde os alunos do ensino médio são incentivados a resolver em
pequenos grupos desafios propostos pelo professor.
Nenhum adolescente usa caderno feito de papel ou é
obrigado a tirar cópias de livros. Tudo é digital. E, apesar de metade dos
estudantes ter pais que não possuem diploma universitário, fator sempre
associado ao desempenho escolar, a maioria dos alunos da Orestad Gymnasium tem
um aproveitamento superior à média nacional. A cerca de 6 000 quilômetros dali,
em Nova York, a iSchool, criada em 2007, também tem resultados que são motivo
de orgulho.
Da turma formada no ano passado, 95% dos alunos
foram aprovados em universidades. Como a média do estado é de 65%, levou pouco
tempo até que a escola chamasse a atenção e virasse objeto de análise de
educadores de todo o mundo. Como explicar tamanha eficiência? “A estratégia foi
repensar a educação e adequá-la à nova realidade, em
que as crianças passam a maior parte de seu dia conectadas à internet”, afirma
a americana Isora Bailey, diretora da iSchool.
Na escola localizada no bairro Soho, os professores
decidem quando as aulas serão expositivas, offline ou online. Neste último
caso, ter acesso à internet não quer dizer ficar vendo vídeos
bizarros no YouTube ou conversando no Facebook. A navegação na web é restrita
ao conteúdo relacionado às atividades escolares.
Como nas classes tradicionais, os professores
escolhem se os exercícios serão feitos em pequenos grupos ou individualmente. A
diferença é que, quando os alunos estão trabalhando sozinhos, um software
centraliza e registra as atividades. Com isso, os professores sabem exatamente
o que cada aluno fez. “Usamos tudo o que está à disposição para manter a
motivação dos alunos”, diz Isora.
Exemplos como o da Orestad Gymnasium e da iSchool
são cruciais porque eles indicam possíveis caminhos para o futuro da educação.
A popularização dos computadores e
da internet nas últimas duas décadas mudou a maneira como os consumidores
compram, como as pessoas se comunicam, como boa parte das empresas trabalha e
como as notícias se propagam.
Pouca gente duvida que as salas de aula serão
afetadas da mesma forma, mas o curioso é que, até agora, a esperada revolução
na área da educação não aconteceu. É fato que o ambiente escolar foi invadido
por PCs — no Brasil, há uma máquina para cada grupo de seis alunos e, nos
países ricos, a média é de um computador para cada dupla. Embora o acesso à
internet nas escolas seja um fato, ainda não se conseguiu medir com exatidão
seus efeitos em larga escala.
Em 2007, o governo do Peru realizou um dos maiores
programas de distribuição de notebooks para crianças e jovens no mundo
emergente. Mais de 850 000 computadores foram instalados em escolas de
todo o país, mas, depois de cinco anos, um relatório do Banco Interamericano de
Desenvolvimento mostrou que os alunos que receberam os equipamentos não tiveram
nenhuma melhoria em leitura ou matemática.
“Pecamos por excesso de otimismo ao pensar que
colocar computadores nas escolas era sinônimo de obter saltos de qualidade”,
diz o professor chileno Eugenio Severin, ex-consultor de educação do Banco
Interamericano de Desenvolvimento. Com base em experiências como a peruana,
houve uma mudança de mentalidade nos meios acadêmicos. Não se pensa mais em
computação como solução mágica. “Com ou sem tecnologia, o essencial continua
sendo contar com um bom professor”, diz Severin.
Uma das linhas atualmente mais aceitas entre os
especialistas em educação é o uso da tecnologia para personalizar o ensino e
resolver o problema do desnível de conhecimento e de ritmos diferentes de
aprendizagem entre os alunos de uma mesma classe. “A maioria das escolas
tradicionais nunca vai educar bem todos os alunos, porque o que é bom para
alguns não funciona para outros”, afirma o professor Michael Horn, coautor do
best-seller Disrupting Class (“Aula disruptiva”, numa tradução livre). Escrito
em parceria com Clayton Christensen, professor da Harvard Business School, o
livro já vendeu quase 100 000 cópias em todo o mundo.
A varejista online Amazon criou o conceito de “uma
loja para cada cliente” no início dos anos 90. Mostrou que é possível usar
softwares para descobrir os produtos de preferência dos clientes e oferecer uma
página da loja virtual diferente a cada um deles. Nos últimos anos, a ideia de
prestar atenção nas demandas individuais começou a ganhar mais força na área da
educação, impulsionada principalmente pela disseminação de softwares chamados
de sistemas de gestão do aprendizado, que centralizam todas as atividades dos
alunos.
A rede de escolas Integral, de Campinas, com 1 800
estudantes, todos eles portadores de um iPad, é uma das adeptas da nova
tecnologia. Com a ajuda de um software da empresa americana AirWatch, os
professores da Integral passaram a enviar aos tablets dos alunos o conteúdo
indicado para cada um deles.
Mesmo a distância, a escola acompanha o que os
estudantes acessam, sabe se eles fazem as atividades e com que grau de
dificuldade. Isso permite que os professores possam dar atenção aos alunos
menos adiantados e manter os primeiros da classe motivados com questões
desafiadoras. Em caso de dúvida, todos têm acesso às apresentações dos
professores, que ficam disponíveis na rede.
A inspiração dos vídeos vem do americano Salman
Khan. Formado em matemática, ciência da computação e engenharia elétrica pelo
Instituto de Tecnologia de Massachusetts, Khan começou, em 2008, a gravar aulas
de matemática para sua prima, então com 12 anos, e colocá-las no YouTube.
Atualmente, com a ajuda de personalidades como Bill Gates, Khan tem mais de 4 000 vídeos gratuitos sobre temas tão
variados como física e história no seu site (www.khanacademy.org).
No início de 2013, ele esteve no Brasil para
assinar um convênio com o governo federal. Seu objetivo é disponibilizar suas
aulas aos estudantes brasileiros. Para que isso aconteça, a Fundação Lemann,
ONG voltada para o tema da educação, está traduzindo para o português aulas que
já foram vistas por mais de 220 milhões de pessoas em todo o mundo.
“O sistema educacional predominante nos dias de
hoje foi concebido há centenas de anos, com a tecnologia que estava disponível
naquela época”, diz Khan. “Queremos que mais pessoas sejam educadas e que isso
seja economicamente viável. A pergunta é: não podemos fazer melhor, levando em
consideração a tecnologia que temos à nossa disposição hoje?”
Admirável mundo novo
A norueguesa Elisabeth Engum, professora de
matemática na Bjorgvin Secondary School, em Bergen, a 500 quilômetros de Oslo,
é uma das educadoras que estão na ponta dessa nova fronteira. Elisabeth foi uma
das primeiras na aplicação de um novo conceito: o flipped classroom, ou “aula
invertida”, numa tradução livre. Quando estão em casa, os alunos de Elisabeth
assistem às aulas expositivas gravadas especialmente pela professora.
Na escola, o tempo é usado em atividades para
aplicar o que foi aprendido nos vídeos. Elisabeth conta que é trabalhoso criar
um conteúdo atrativo quando está gravando e, depois, pensar em exercícios
diferentes para ser aplicados no horário das aulas. Mas o método também exige
mais dos jovens. “Ouvir o professor falar é muito fácil. Agora, os alunos são
obrigados a assumir mais responsabilidades sobre as tarefas”, diz.
Essa nova fase da educação tem atraído o interesse
de fornecedores de tecnologia. A Apple pesquisa com editoras e desenvolvedores
de aplicativos maneiras de aumentar o uso do seu tablet, o iPad, nas escolas.
Outras empresas de tecnologia, como Microsoft, Cisco, Intel, Qualcomm,
Dell e HP, têm projetos direcionados a esse novo mercado, estimado em 56
bilhões de dólares anuais.
“Os grandes fabricantes já perceberam que não basta
apenas vender o hardware para lucrar nesse segmento”, diz o professor Jim
Lengel, da Universidade de Nova York e consultor dos projetos de empresas como
Apple e Sony. Duas décadas depois da chegada do PC à sala de aula, uma lição
parece ter sido aprendida. A tecnologia é válida quando ajuda as crianças e os
jovens a desenvolver a capacidade de formular ideias e resolver problemas. Para
os bons educadores, o desafio sempre foi esse.
Acessado em 23/05/2013
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