COLL,
CÉSAR E OUTROS. O CONSTRUTIVISMO NA SALA DE AULA. SÃO PAULO: ÁTICA, 2006.
Jeferson
Anibal Gonzalez - Pedagogo (FFCLRP/USP) e Mestrando em Educação (FE/UNICAMP).
Membro do Grupo de Estudos e Pesquisas. História, Sociedade e Educação no
Brasil. HISTEDBR (GT/UNICAMP).
O
construtivismo não é uma teoria, e sim uma referência explicativa, composta por
diversas contribuições teóricas, que auxilia os professores nas tomadas de
decisões durante o planejamento, aplicação e a avaliação do ensino.
Ou
seja, o construtivismo não é uma receita, um manual que deve ser seguido à
risca sem se levar em conta as necessidades de cada situação particular. Ao
contrário, os profissionais da educação devem utilizá-lo como auxílio na
reflexão sobre a prática pedagógica; sobre o como se aprende e
se ensina, considerando-se o contexto em que os agentes educativos estão inseridos.
Essas afirmações demonstram a necessidade de se compreender os conteúdos da
aprendizagem como produtos sociais e culturais, o professor como agente
mediador entre indivíduo e sociedade, e o aluno como aprendiz social.
Tendo
em vista uma educação de qualidade, entendida como aquela que atende a
diversidade, o processo educativo não é responsabilidade do professor somente.
Desse modo, o trabalho coletivo dos professores, normas e finalidades
compartilhadas, uma direção que tome decisões de forma colegiada, materiais
didáticos preparados em conjunto, a formação continuada e a participação dos
pais são pontos essenciais para a construção da escola de qualidade.
A
instituição escolar é identificada pelo seu caráter social e socializador. É
por meio da escola que os seres humanos entram em contato com uma cultura
determinada.
Nesse
sentido, a concepção construtivista compreende um espaço importante à
construção do conhecimento individual e interação social, não contrapondo
aprendizagem e desenvolvimento. Aprender não é copiar ou reproduzir, mas
elaborar uma representação pessoal da realidade a partir de experimentações e
conhecimentos prévios. É preciso aprender significativamente, ou
seja, não apenas acumular conhecimentos, mas construir significados próprios a
partir do relacionamento entre a experiência pessoal e a realidade. A
pré-existência de conteúdos confere certa peculiaridade à construção do
conhecimento, que deve ser entendida como a atribuição de significado pessoal
aos conteúdos concretos, produzidos culturalmente.
Pensando
especificamente o trabalho do professor, o construtivismo é uma concepção útil
à tomada de decisões compartilhadas, que pressupõe o trabalho em equipe na
construção de projetos didáticos e rotinas de trabalho.
Por
fim, é importante ressaltar que o construtivismo não é um referencial acabado,
fechado a novas contribuições; sua construção acontece no âmbito da situação de
ensino/aprendizagem e a ela deve servir.
2.
Disponibilidade para a aprendizagem e sentido da aprendizagem (Isabel Solé)
A
aprendizagem é motivada por um interesse, uma necessidade de saber. Mas o que
determina esse interesse, essa necessidade? Não é possível elaborar uma única
resposta a essa questão. No entanto, um bom caminho a seguir é compreender que
além dos aspectos cognitivos, a aprendizagem envolve aspectos
afetivo-relacionais. Ao construir os significados pessoais sobre a realidade,
constrói-se também o conceito que se tem de você mesmo (autoconceito) e a
estima que se professa (auto-estima), características relacionadas ao
equilíbrio pessoal. O autoconceito e a auto-estima influenciam a forma como o
aluno constrói sua relação com os outros e com o conhecimento; reconhecer essa
dimensão afetivo-relacional é imprescindível ao processo educativo.
Em
relação à motivação para conhecer, é necessário compreender a maneira como
alunos encaram a tarefa de estudar, que pode ser dividida em dois enfoques:
o enfoque profundo e o enfoque superficial.
No enfoque profundo, o aluno se interessa por compreender o
significado do que estuda e relaciona os conteúdos aos conhecimentos prévios e
experiências. Já no enfoque superficial, a intenção do aluno limita
se a realizar as tarefas de forma satisfatória, limitando-se ao que o professor
considera como relevante, uma resposta desejável e não a real compreensão do
conteúdo. Importante ressaltar que o enfoque com que o aluno aborda a tarefa
pode variar; dessa forma, o enfoque profundo pode ser a abordagem de uma
relação a uma tarefa e o enforque superficial em relação a outras pelo mesmo
aluno. A inclinação dos alunos para um enfoque ou outro vai depender, dentre
outros fatores, da situação de ensino da qual esse aluno participa.
Entretanto,
o enfoque profundo pode ser trabalhado com os alunos de maneira intencional.
Para isso, é preciso conhecer as características da tarefa trabalhada, o que se
pretende com determinado conteúdo e a sua necessidade. Tudo isso demanda tempo,
esforço e envolvimento pessoal.
Outro
ponto importante a ser ressaltado é que o professor, ao entrar numa sala de
aula, carrega consigo certa visão de mundo e imagem de si mesmo, que
influenciam seu trabalho e sua relação com os alunos. Da mesma forma, os alunos
constroem representações sobre seus professores.
Reconhecer
esses aspectos afetivos e relacionais é fundamental para motivação e interesse
pela construção de conhecimento, tendo em vista que o autoconceito e a
auto-estima, ligados às representações e expectativas sobre o processo
educativo, possuem um papel mediador na aprendizagem escolar.
As
interações, no processo de construção de conhecimento, devem ser caracterizadas
pelo respeito mútuo e o sentimento de confiança. É a partir dessas interações,
das relações que se estabelecem no contexto escolar, que as pessoas se educam.
Levar isto em consideração é compreender o papel essencial dos aspectos
afetivo-relacionais no processo de construção pessoal do conhecimento sobre a
realidade.
3.
Um ponto de partida para a aprendizagem de novos conteúdos: os conhecimentos
prévios (Mariana Miras)
Quando
se inicia um processo educativo, as mentes dos alunos não estão vazias de
conteúdo como lousas em branco. Ao contrário, quando chegam à sala de aula os
alunos já possuem conhecimentos prévios advindos da experiência pessoal. Na
concepção construtivista é a partir desses conhecimentos que o aluno constrói e
reconstrói novos significados.
Identificam-se
alguns aspectos globais como elementos básicos que auxiliam na determinação do
estado inicial dos alunos: a disposição do aluno para realizar a tarefa
proposta, que conta com elementos pessoais e interpessoais com sua auto-imagem,
auto-estima, a representação e expectativas em relação à tarefa a ser
realizada, seus professores e colegas; capacidades, instrumentos, estratégias e
habilidades compreendidas em certos níveis de inteligência, raciocínio e
memória que possibilitam a realização da tarefa.
Os
conhecimentos prévios podem ser compreendidos como esquemas de
conhecimento, ou seja, a representação que cada pessoa possui sobre a
realidade. É importante ressaltar que esses esquemas de conhecimento são sempre
visões parciais e particulares da realidade, determinadas pelo contexto e
experiências de cada pessoa. Os esquemas de conhecimento contêm, ainda,
diferentes tipos de conhecimentos, que podem ser, por exemplo, de ordem
conceitual (saber que o coletivo de lobos é alcatéia), normativa (saber que não
se deve roubar), procedimental (saber como se planta uma árvore). Esses
conhecimentos são diferentes, porém não devem ser considerados melhores ou
piores que outros.
Para
o ensino coerente, é preciso considerar o estado inicial dos alunos, seus
conhecimentos prévios e esquemas de conhecimentos construídos. Esse deve ser o
início do processo educativo: conhecer o que se tem para que se possa, sobre
essa base, construir o novo.
4.
O que faz com que o aluno e a aluna aprendam os conteúdos escolares? A natureza
ativa e construtiva do conhecimento (Teresa Mauri)
Entre
as concepções de ensino e aprendizagem sustentadas pelos professores,
destacam-se três, cada uma considerando que aprender é:
1)
Conhecer as respostas corretas: Nessa concepção entende-se que aprender
significa responder satisfatoriamente as perguntas formuladas pelos
professores. Reforçam-se positivamente as respostas corretas, sancionando-as.
Os alunos são considerados receptores passivos dos reforços dispensados pelos
professores.
2)
Adquirir os conhecimentos relevantes: Nessa concepção, entende-se que o aluno
aprende quando apreende informações necessárias. A principal atividade do
professor é possuir essas informações e oferecer múltiplas situações
(explicações, leituras, vídeos, conferências, visitas a museus) nas quais os
alunos possam processar essas informações. O conhecimento é produto da cópia e
não processo de significação pessoal.
3)
Construir conhecimentos: Os conteúdos escolares são aprendidos a
partir do processo de construção pessoal do mesmo. O centro do processo
educativo é o aluno, considerado como ser ativo que aprende a aprender.
Auxiliar a construção dessa competência é o papel do professor.
A
primeira concepção está ligada às concepções tradicionais, diferenciada em
relação às duas restantes por enfatizar o papel supremo do professor na
elaboração das perguntas.
As
outras duas concepções, pelo contrário, ocupam-se de como os alunos adquirem
conhecimentos; no entanto, entendem de formas diferentes esse processo.
Compreendendo-se
que aprender é construir conhecimentos, identifica-se a natureza ativa dessa
construção e a necessidade de conteúdos ligados ao ato de aprender conceitos,
procedimentos e atitudes. Nesse sentido, é preciso organizar e planejar
intencionalmente as atividades didáticas tendo em vista os conteúdos das
diferentes dimensões do saber: procedimental (como a observação de plantas); conceitual
(tipos e parte das plantas); e atitudinal (de curiosidade, rigor, formalidade,
entre outras). O trabalho com esses conteúdos demonstra a atividade complexa
que caracteriza o processo educativo, trabalho que demanda o envolvimento
coletivo na escola.
5.
Ensinar: criar zonas de desenvolvimento proximal e nelas intervir (Javier
Onrubia)
O
ensino na concepção construtivista deve ser entendido como uma ajuda ao
processo de ensino-aprendizagem, sem a qual o aluno não poderá compreender a
realidade e atuar nela. Porém, deve ser apenas ajuda porque não pode substituir
a atividade construtiva do conhecimento pelo aluno.
A
análise aprofundada do ensino enquanto ajuda leva ao conceito de ajuda ajustada
e de zona de desenvolvimento proximal (ZDP). No conceito de ajuda ajustada
observa-se que o ensino, enquanto ajuda o processo de construção do
conhecimento, deve ajustar-se a esse processo de construção. Para tanto,
conjuga duas grandes características: 1) a de levar em conta os esquemas de
conhecimento dos alunos, seus conhecimentos prévios em relação aos conteúdos a
serem trabalhados; 2) e, ao mesmo tempo, propor desafios que levem os alunos a
questionarem esses conhecimentos prévios. Ou seja, não se ignora aquilo que os
alunos já sabem, porém aponta-se para aquilo que eles não conhecem, não
realizam ou não dominam suficientemente, incrementando a capacidade de compreensão
e atuação autônoma dos alunos.
O
conceito de zona de desenvolvimento proximal (ZDP) foi proposto pelo psicólogo
soviético L. S. Vygotsky, partindo do entendimento de que as interações e
relações com outras pessoas são a origem dos processos de aprendizagem e
desenvolvimento humano. Nesse sentido, a ZDP pode ser identificada como o
espaço no qual, com a ajuda dos outros, uma pessoa realiza tarefas que não
seria capaz de realizar individualmente. A contribuição do conceito de ZDP está
relacionada à possibilidade de se especificar as formas em aula, ajudando os
alunos no processo de significação pessoal e social da realidade.
Para
o trabalho com os conceitos acima arrolados, indicam-se os seguintes pontos: 1)
Inserir atividades significativas na aula; 2) Possibilitar a participação de
todos os alunos nas diferentes atividades, mesmo que os níveis de competência,
conhecimento e interesses forem diferenciados; 3) Trabalhar com as relações
afetivas e emocionais; 4) Introduzir modificações e ajustes ao logo da
realização das atividades; 5) Promover a utilização e o aprofundamento autônomo
dos conhecimentos que os alunos estão aprendendo; 6) Estabelecer relações entre
os novos conteúdos e os conhecimentos prévios dos alunos; 7) Utilizar linguagem
clara e objetiva evitando mal-entendidos ou incompreensões; 8) Recontextualizar
e reconceitualizar a experiência. Trabalhar a partir dessas concepções
caracteriza desafios à prática educativa que não está isenta de problemas e
limitações. No entanto, entende-se que esse esforço, mesmo que acompanhado de
lentos avanços, é decisivo para a aprendizagem e o desenvolvimento das escolas
e das aulas.
6.
Os enfoques didáticos (Antoni Zabala)
A
concepção construtivista considera a complexidade e as distintas variáveis que
intervêm nos processos de ensino na escola. Por isso, não receita formas
determinadas de ensino, mas oferece elementos para a análise e reflexão sobre a
prática educativa, possibilitando a compreensão de seus processos, seu
planejamento e avaliação.
Um
método educacional sustenta-se a partir da função social que atribui ao ensino
e em determinadas ideias sobre como as aprendizagens se produzem. Nesse
sentido, a análise das tarefas que propõem e conteúdos trabalhados, explícita
ou implicitamente (currículo oculto), requer a compreensão do determinante
ideológico que embasam as práticas dos professores. A discriminação
tipológica dos conteúdos, ou seja, a análise dos conteúdos trabalhados
segundo a natureza conceitual, procedimental ou atitudinal, mostra-se como
importante instrumento de entendimento do que acontece na sala de aula.
Outro
instrumento importante para a compreensão do processo educativo é a concepção
construtivista da aprendizagem, que estabelece a aprendizagem como uma
construção pessoal que o aluno realiza com a ajuda de outras pessoas; processo
que necessita da contribuição da pessoa que aprende, implicando o interesse,
disponibilidade, conhecimentos prévios e experiência; implica também a figura
do outro que auxilia na resolução do conflito entre os novos saberes e o que já
se sabia, tendo em vista a realização autônoma da atividade de aprender a
aprender.
O
problema metodológico para o fazer educativo não se encontra no âmbito do como
fazemos, mas antes na compreensão do que fazemos e por quê. Na elaboração das
seqüências didáticas que devem auxiliar a prática educativa deve-se levar em
consideração os objetivos e os meios que se tem para facilitar o alcance desses
objetivos.
7.
A avaliação da aprendizagem no currículo escolar: uma perspectiva
construtivista (César Coll e Elena Martín)
A
questão da avaliação do processo educativo tem sido muito discutida. Com o
desenvolvimento de propostas teóricas, metodológicas e instrumentais,
expressões e conceitos como o de avaliação inicial, formativa e
somatória povoam o vocabulário educacional. Junto a isso, construiu-se
o consenso de que não se deve avaliar somente o aluno, mas também a atuação do
professor, o planejamento de atividades e também sua aplicação. No entanto,
muitas questões ainda se encontram sem respostas e se configuram como desafios
aos envolvidos com o tema.
Uma
primeira questão a ser levantada é a relação entre a avaliação e uma série de
decisões relacionadas a ela, como promoção, atribuição de crédito e formatura
de alunos. Essas decisões não fazem parte, em sentido estrito, do processo de
avaliação, porém essas decisões devem ser coerentes com as avaliações
realizadas. O desafio é alcançar a máxima coerência entre os processos
avaliativos e as decisões a serem tomadas.
Todo
processo avaliativo deve levar em conta os elementos afetivos e relacionais da
avaliação. Desse modo, o planejamento das atividades avaliativas parte do
entendimento de que o aluno atribui certo sentido a essa atividade, sentido que
depende da forma como a avaliação lhe é apresentada e também de suas
experiências e significações pessoais e sociais da realidade. É preciso levar
em conta também o caráter sempre parcial dos resultados obtidos por meio das
avaliações, devido à complexidade e diversificação das situações de
aprendizagem vivenciadas pelos alunos. Assim, as práticas avaliativas
privilegiadas devem ser aquelas que consideram a dinâmica dos processos de
construção de conhecimentos.
Ao
contrário das concepções que buscam neutralizar as influências do contexto nos
resultados das avaliações, a concepção construtivista ressalta a necessidade de
considerar as variáveis proporcionadas pelos diversos contextos particulares.
Para
isso, recomenda-se a utilização de uma gama maior possível de atividades de
avaliação ao longo do processo educativo.
Partindo
da consideração que é na prática que se utiliza o que se aprende,
um dos critérios, que devem ser levantados nas atividades avaliativas, é o
menor ou maior valor instrumental das aprendizagens realizadas, ou seja, em que
grau pode-se utilizar o que se aprendeu, o que se construiu na significação dos
saberes. Na medida em que aprender a aprender significa a capacidade para
adquirir, de forma autônoma, novos conhecimentos, avaliar os aspectos
instrumentais, é de suma importância a qualidade da educação.
Por
fim, ressalta-se a necessidade da abordagem da avaliação em estreita ligação
com o planejamento didático e o currículo escolar. Dessa forma, o quê, como e
quando ensinar e avaliar se unem configurando uma prática educativa global, na
qual as atividades avaliativas não estão separadas das demais atividades de
construção de conhecimento pelos alunos.
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