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quarta-feira, 22 de junho de 2016

O portfólio nos projetos de trabalho



         
        O portfólio (pasta de trabalho e registros) é uma modalidade de avaliação devedora do campo da arte. Não é essa a primeira vez que o âmbito da Educação apresenta uma relação com o campo da arte mediante uma apropriação e uso de metáforas e analogias que se revelaram frutíferas. No tema concreto da avaliação, no início dos anos 70 Eisner já sugeriu a possibilidade de servir-se, no momento da avaliação, de uma estratégia similar à empregada pela crítica no campo da arte.
        A conexão do portfólio com o trabalho dos artistas é explicada por Gardner nos seguintes termos: “Na vida cotidiana, são os artistas que estão interessados em ingressar numa Escola, ou em competir para obter um prêmio ou uma exposição numa galeria os que montam as pastas (os portifólios) com maior freqüência. Constituídas assim, são coleções dos produtos acabados. Em troca, nossas pastas (portifólios) estão deliberadamente pensadas para serem recordações de ‘obras em processo’”.
        Arquitetos, desenhistas e artistas recolhem, selecionam e ordenam amostras de sua trajetória profissional para poder apresentá-las em um suporte físico (o portfólio), de maneira que o destinatário possa apreciar os marcos mais significativos de seu percurso, ao mesmo tempo em que adquire uma visão global do mesmo.
        No Ensino Fundamental, Médio e Superior, é possível realizar um processo de seleção e ordenação de amostras que reflitam a trajetória de aprendizagem de cada estudante, de maneira que, além de evidenciar seu percurso e refletir sobre ele, possam contrastá-lo com as finalidades de seu processo e as intenções educativas e formativas dos docentes. A função do portfólio se apresenta, assim, como facilitadora da reconstrução e da reelaboração por parte de cada estudante de seu próprio processo ao longo de um curso ou de um período ou ciclo de ensino.
        A utilização do portfólio como recurso de avaliação é baseada na ideia da natureza evolutiva do processo de aprendizagem. O portfólio oferece aos alunos e professores uma oportunidade de refletir sobre o progresso dos estudantes em sua compreensão da realidade, ao mesmo tempo em que possibilita a introdução de mudanças durante o desenvolvimento do programa de ensino. Além, disso, permite aos professores aproximar-se do trabalho dos alunos não de uma maneira pontual e isolada, como acontece com as provas e exames, mas, sim, no contexto do ensino e como uma atividade complexa baseada em elementos e momentos de aprendizagem que se encontram relacionados.
        Por sua vez, a realização do portfólio permite ao alunado sentir a aprendizagem institucional como algo próprio, pois cada um decide que trabalhos e momentos são representativos de sua trajetória, estabelece relações entre esses exemplos, numa tentativa de dotar de coerência as atividades de ensino, com as finalidades de aprendizagem que cada um e o grupo se tenha proposto.
        Chegando a essa altura, poderíamos definir o portfólio como um continente de diferentes classes de documentos (notas pessoais, experiências de aula, trabalhos pontuais, controles de aprendizagem, conexões com outros temas fora da Escola, representações visuais, etc.) que proporciona evidências do conhecimento que foi sendo construído, das estratégias utilizadas para aprender e da disposição de quem o elabora em continuar aprendendo.
        Mas um portfólio é algo mais do que a recompilação de trabalhos ou materiais guardados numa pasta, ou os apontamentos e notas tomadas em sala de aula passados a limpo, ou uma coleção de recordações de aula coladas num álbum. Um portfólio não implica só selecionar, ordenar evidências de aprendizagem e colocá-las num formato para serem mostradas. Como assinala Gardner, no portfólio é possível identificar questões relacionadas com o modo como os estudantes e os educadores refletem sobre quais são os objetivos de sua aprendizagem, aqueles que foram cumpridos e os que não foram cobertos, onde foi enfocado de maneira inadequada o esforço para a aprendizagem e em que direções torna-se mais promissor enfocá-lo para o futuro. Definitivamente, permite que cada aluno reconstrua seu próprio processo de aprendizagem.
        O que caracteriza o portfólio como modalidade de avaliação não é tanto seu formato físico (pasta, caixa, CD-ROM, etc.) como a concepção do ensino e aprendizagem que veicula. O que particulariza o portfólio é o processo constante de reflexão, de contraste entre as finalidades educativas e as atividades realizadas para sua consecução, para explicar o próprio processo de aprendizagem e os momentos-chave nos quais o estudante superou ou localizou um problema.

Critérios de avaliação de um portfólio
Avaliar um portfólio, ou seja, pronunciar-se pelo valor educativo e formativo do processo reconstruído, e se quisermos qualificá-lo, não é mais difícil do que avaliar e qualificar o saber que se explicita num exame, num ensaio, num trabalho de pesquisa ou num projeto, ainda que possa ser, de fato, pela quantidade e diversidade de informação que recolhe, mais trabalhoso. Em geral, o êxito do esforço dos estudantes e o valor das apreciações que realizam os docentes dependem, em grande parte, da clareza dos propósitos do portfólio e da aprendizagem de cada aluno, e das finalidades do curso, por parte do professor. Neste ponto cabe fazer notar que não costuma ser habitual que o professor mostre, de antemão e de forma pormenorizada, todos esses detalhes. Assim, se um docente ou equipe de docentes decide utilizar o portfólio, terá que revisar o conjunto do planejamento de sua atividade de docente.
        Em nosso caso, utilizamos para avaliá-los uma estratégia de diálogo que nos permite estabelecer, junto com os alunos, alguns critérios que permitam organizar suas produções. Critérios que podem ir desde a mera recompilação de evidências até a interpretação dos problemas surgidos ao longo do processo de aprendizagem.
        O portfólio, à diferença de outras formas de avaliação, como o exame, dá a oportunidade aos professores e aos alunos de refletirem sobre o desenvolvimento dos estudantes e suas mudanças ao longo do curso (o que não se aprecia com um exame ou com alguns métodos estatísticos).
        O portfólio permite aos professores acompanhar o trabalho dos estudantes num contexto em que a atividade de ensinar é considerada como uma atividade complexa com elementos inter-relacionados. Nesse sentido, ele permite apreciar a relação das partes com o todo e, sobretudo, é um recurso para relacionar a teoria com a prática. Os projetos de trabalho terminam num portfólio em que cada aluno seleciona, ordena as evidências que foram sendo reunidas durante a pesquisa para responder ao problema proposto. Dessa maneira, estendem ao portfólio as estratégias de relação com a informação aprendidas durante a realização do projeto.
        O portfólio, como modalidade de avaliação vinculada à reconstrução do processo de aprendizagem, tenta abordar algumas problemáticas relacionadas à representação do conhecimento elaborado pelos alunos, ao mesmo tempo em que introduz outras que requerem mudanças com respeito à situação atual da formação dos professores, à perspectiva sobre o ensino e a aprendizagem, ao papel dos alunos, à interação docente, à definição dos conteúdos e sua relação com as atividades, à atitude investigadora na sala de aula...

Texto extraído de Transgressão e Mudança na Educação

Os Projetos de Trabalho – ARTMED – 1998 Fernando Hernández




(Cap. IV – A avaliação como parte do processo dos projetos de trabalho – p.98/101)

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